domingo, novembro 28, 2010

(não) sou casa

minha casa sou
grades na janela
me afastam da floresta que vi crescer
livros sobre minha cabeça
meus quadros na parede
caminhos interrompidos em toda parte
muitos depois eu vejo por aí

minha casa não é minha
muitas mãos mexem
trocam as coisas de lugar
largam tudo pra eu resolver
mas não resolvo problema dos outros
e tudo como está fica
anos a fio

a vontade?
fazer uma mochilinha
pegar o essencial
e picar mula
deixando tudo pra trás

ou então reutilizar:
"o centro cultural casa burguesa"
livros viram biblioteca
roupas são usadas no teatro
nas festas da comunidade
as mulheres podem retirar peças
que nem livro
alegrar a vida cotidiana
tem música, filmes, instrumentos musicais
mesa para desenhar pesquisar reunir
canetas, tintas, massa de modelar

ainda tem louça inglesa e toalhas rendadas
uma ou outra travessa de prata
são as coisas que me prendem
ordenam viva essa vida.

mas é cheia de cores e movimento
tudo está aberto e disponível
tudo gira em torno de um centro
todos se vendo e se falando
em permanente comunicação
fui eu que criei isso
acho
todos em franca colaboração
sabendo de todos todo o tempo...

vou criar uma solidão para mim
(eu posso)
só em mim é real
(eu tenho que criar)
sem ela meus filhos
não irão crescer
(é urgente)

só sendo só
não sou casa
nem casar
sou



.

sexta-feira, novembro 26, 2010

exagero

"só o exagero é verdadeiro
num mundo surdo"
 "sou mesmo exagerado
adoro um amor inventado"


exagero sempre.
é delicioso
entregar-se
às palavras...
inebriar-se
de palavras

mas há dor
é o erro
ardor
sempre veloz
chega primeiro
já não tem como
apagá-lo
ignorá-lo

mas a dor
passou
passado

sigo adiante
exagerante

aprendo devagar
um pouquinho só de cada vez
e exagero certeiro

porque deixar
exagero
de exagerar
não prometo
e quando prometo
descumpro


me conheço
exagero


.

quinta-feira, novembro 25, 2010

sim

te escuto de repente
escuto junto minha surdez
como aguenta tanto ruído?

vejo seu cansaço
mesmo que doce

vi você
pessoa
precisava
pessoa

delicado
me conta
paciente
explica

suave
sim
eu quero
saber

..

quarta-feira, novembro 24, 2010

(não) sou carne

1.
sou grosseiramente material
feita de carne e suco
movida a sonhos juvenis
perdida ainda na floresta
e achando graça...

sou crua como a matéria
e a arte não é também matéria?

2.
a carne da arte é a práxis
ação na matéria

a teoria só existe
separada
por causa da divisão social do trabalho
é um comando
para as classes trabalhadoras
façam de acordo com o que pensei
quem?
os filhos que estudam (ricos)

por isso que a chegada dos pobres
na universidade
muda a arte

a arte os inclui
reconhecendo em si
os mecanismos internos
de exclusão
e de mando
transforma-se
busca sim utilidade
inserção

3.
o artista é sustentado por sua classe social
ele tá condenado a ela
que linguagem ele fala?
quem entende sua estética?
como ser livre desse jeito?

4.
o artista quer um lugar
sem jogar o jogo sujo do real
privilégios de classe?

5.
vou lá jogar
sei jogar
(me assusto com a certeza
de que sim sei
e o jogo é mesmo sujo
e essa sujeira na verdade conheço bem
por isso me sustentam
por isso quando falo falo deles..

6.
meu faro de artista diz
vai no difícil
difícil é o prazer
exposição total

que nem as atrizes
que fazem da nudez no palco
uma liberação ritualística,
desse portal pra lá
não há mais pudores
é o trabalho

7.
o trabalho é explicitar
o que tenho a dizer?
sou carne
mulher
que valho?

o que a sociedade
vai cobrar
das mulheres
em troca da emancipação política?

8.
será preciso defender a liberdade
fazer a crítica ao casamento
alegrar o sexo
triste no consumo
frágil no sofrimento

9.
mas imagino mundos melhores
nele não sou carne
sou eu
inteira.
não vendo minha matéria
nem entranha nem pele
mas junto a outros saberes
esse meu
e produzimos
para nós mesmos


..

segunda-feira, novembro 22, 2010

espera

sou mil
todas alegres
oferecidas
puras

me aquece..
ilumina..
sol
mil


..

sábado, novembro 20, 2010

só no sábado

calor
na rede.

e leitura:
criativo
espera/nutrição
insensatez adolescente
solidariedade

e nitche:
a superação do herói
do reconhecimento
cria o super herói
o além homem

e imaginação:
só o bom
e simples



.

descanso

o seu desejo

vem manso

encosta na minha pele

e descansa

te aceito

homem

a confiança na ação

das mãos e da mente

volta

a te

viver

amor



..

empate

sim feiticeira
quero enredar
envolver
me dar

mas foi você
que começou
me enfeitiçou
me envolveu
delicado
lembra?

eu só quero agora
viver o feitiço
e sua poderosa energia libertadora
depois aprendo sua calma
poderosa realização

que tal?



.

sexta-feira, novembro 19, 2010

deixa eu contar uma história

era uma vez uma menina
que sempre sonhou com o amor
não estava naqueles meninos
que adoram tudo que a gente faz
não estava nos fortões de treze gols
mas que tinham a língua rachada...

e ela encontrou
um menino que nem ela
que gostava de gostar
e eles quiserem estar juntos
mas eram meninos
e formaram-se uma ao outro
em universo particular

um dia na noite ela olhou as estrelas
ah, tinha uma que brilhava muito...

ela saiu pela noite
tinha um mundo a rodar ainda
virgem
uma princesa
encastelada

então a prisão
apareceu de repente
quem vai entender?

o menino cresceu junto
entendeu
enxergou ele mesmo
preso



.

quarta-feira, novembro 17, 2010

indo embora

eu tô
tô sim
indo embora

me afasto com amor
de tudo que me segurou
me amparou
me alimentou

tudo em mim é amor
meu passado é amor

bom saber
para ir adiante
sou amor.

por isso
tô sim
tô indo embora

não preciso de um mau motivo
construir a destruição de mim
não
tô indo só
porque preciso ir


.

domingo, novembro 07, 2010

quieta menina

não, vou deixar a amargura de lado
sai que você não é pra mim

não, vou curtir adoidado
que eu sei o que é bom pra mim

bom é você você você
não assusta não
que eu não vou te prender

bom é tocar sua pele sua alma
doce doce doce

bom é saber que você tá aqui
aqui dentro aqui inteiro

assusta não se fecha não
que eu tô quieta menina

eu gosto só
livre franco
gosto só

não sou boba... sou esperta
gosto do que me desperta



..

não por muito tempo

alegria foge
palavras amargas virão
explicarão
promessas feitas
desfeitas

eu quero saber?

desmanchar o último castelo
soprar as cartas pisar a areia
e novos castelos virão
movida a paixão
eles dizem

e como viver sem ela?

peço desculpas
desculpa te ver
desculpa entender
desculpa amor
desculpa o excesso
desculpa a pressa

fora timidez
fora insegurança

engulo as desculpas
desculpa querer
querer querer

não vou aguentar
não por muito tempo

palavras amargas virão
eu sei não quero saber


.

sábado, novembro 06, 2010

a louca do bar

I.
num bar de hotel
sempre bêbada
ela só fala de amor
linda, muitos a querem
se aproximam
escutam seu doce canto
meloso
insuportável
ninguém é capaz de levá-la
onde ela quer estar
cada vez mais
ela sabe
mas não pode parar
é um vício
destino
nenhum homem pode suportar seu canto

II.
uma noite
chega um herói
ele curte a louca do bar
linda
não foi por falta de aviso...
mas ele achou divertido o desafio
e perdeu.
não, era insuportável.
tesão nenhum sobrevive àquilo
ele se afasta.
e de longe observa o sofrimento dela
ele entende sua prisão
então ele desfaz o feitiço
segura seus braços
cospe na cara dela
diz umas palavras tortas
e ela acorda.
ele diz "agora você tá livre
pode ir"
mas tem um porém
sempre tem um porém...
você já não pode mais amar.

III.
então ela sai por aí sem rumo
e os homens já não existem pra ela
ela sente um vazio
e só.
ela trabalha, cria, produz
feliz de ser alguém
trabalha mais
cria amizades
a vida antiga
ela esqueceu
não fosse pelo rosto vincado
que ela não cansa de recriar
quando pinta, esculpe, desenha
quando canta, escreve, murmura
em tudo ele está

IV.
num dia cinzento de preguiça
sem razão alguma
ela olha no fundo do copo
a água turvou
e foi ele que ela viu
então ela pediu um uísque
que esquecer já não podia mais
e bebeu a saudade de anos
e naquele bar ela ficou
produzindo seu canto de amor
agora ela sabia que era um aquele
o amor
mas ela tinha que cantar
pra todos os outros que apareciam
e ninguém podia
levá-la para onde ela queria...

V.
o herói que nessa altura
era pai de santo, pajé, feiticeiro
seguia curando as pessoas
e em todas as lindas que ele via
procurava aquela uma primeira
que revelara a ele sua sina curandeira
mas dela não sentia nem o cheiro...
andou por toda a baía
prados, rochedos e selvas cinzentas

mas o dia que é o dia
um dia chega
e chegou.
e os dois se encontraram
a louca do bar
prisioneira do amor
e o herói curandeiro
o algoz de toda a dor
e os olhos que eles olharam
era mais forte que a prisão
e então foi que o encontro
finalmente
se deu



..

ai

ai que acabei de te ver
e estou com saudade...
ai que senti teu corpo me envolvendo delicado
doce calor discreto
sorrindo pra mim
ai
e tenho saudade

você me pede
eu vou
embora
embora

um último beijo
desnecessário
excessivo
carente
fica sempre perdido nos meus lábios
ele te espera
ai
espera

e ainda assim
estou cheia de você
cheia

..

quarta-feira, novembro 03, 2010

delícia

delícia você

eu sei
vivi

louco
amor
doce
você

solene
como tem que ser
a loucura

livre
menino
leve
você

delícia

..

terça-feira, novembro 02, 2010

espaço

na cova do leão
cercada
e no entanto
não sinto o perigo
obedeço


preciso de espaço
para jogar o meu jogo
lanço minha teia
enredo

aí o leão
eriçado
mostra os dentes

vibro
perigo
o leão tem fome

..

educação

é o desejo que é educado
claro
civilizar
é conter instintos

mas é ele
que move
que cria
destrói
liberta

desejo o que sou capaz
por isso saber mais
por isso experimentar
por isso ser

é o desejo que é educado
desejo o que sei
certo
certeiro
miro o presente
abro o futuro
sou



.

segunda-feira, novembro 01, 2010

erro

desejo de mistura
saber o que não foi dito
abrir a porta
à ventania

os dois
invadidos
habitando ubiquamente
os corpos
seus recantos
cômodos passagens e abismos
tornados
magicamente um
de repente
ligados
siameses

..