1.
sou grosseiramente material
feita de carne e suco
movida a sonhos juvenis
perdida ainda na floresta
e achando graça...
sou crua como a matéria
e a arte não é também matéria?
2.
a carne da arte é a práxis
ação na matéria
a teoria só existe
separada
por causa da divisão social do trabalho
é um comando
para as classes trabalhadoras
façam de acordo com o que pensei
quem?
os filhos que estudam (ricos)
por isso que a chegada dos pobres
na universidade
muda a arte
a arte os inclui
reconhecendo em si
os mecanismos internos
de exclusão
e de mando
transforma-se
busca sim utilidade
inserção
3.
o artista é sustentado por sua classe social
ele tá condenado a ela
que linguagem ele fala?
quem entende sua estética?
como ser livre desse jeito?
4.
o artista quer um lugar
sem jogar o jogo sujo do real
privilégios de classe?
5.
vou lá jogar
sei jogar
(me assusto com a certeza
de que sim sei
e o jogo é mesmo sujo
e essa sujeira na verdade conheço bem
por isso me sustentam
por isso quando falo falo deles..
6.
meu faro de artista diz
vai no difícil
difícil é o prazer
exposição total
que nem as atrizes
que fazem da nudez no palco
uma liberação ritualística,
desse portal pra lá
não há mais pudores
é o trabalho
7.
o trabalho é explicitar
o que tenho a dizer?
sou carne
mulher
que valho?
o que a sociedade
vai cobrar
das mulheres
em troca da emancipação política?
8.
será preciso defender a liberdade
fazer a crítica ao casamento
alegrar o sexo
triste no consumo
frágil no sofrimento
9.
mas imagino mundos melhores
nele não sou carne
sou eu
inteira.
não vendo minha matéria
nem entranha nem pele
mas junto a outros saberes
esse meu
e produzimos
para nós mesmos
..