sábado, novembro 06, 2010

a louca do bar

I.
num bar de hotel
sempre bêbada
ela só fala de amor
linda, muitos a querem
se aproximam
escutam seu doce canto
meloso
insuportável
ninguém é capaz de levá-la
onde ela quer estar
cada vez mais
ela sabe
mas não pode parar
é um vício
destino
nenhum homem pode suportar seu canto

II.
uma noite
chega um herói
ele curte a louca do bar
linda
não foi por falta de aviso...
mas ele achou divertido o desafio
e perdeu.
não, era insuportável.
tesão nenhum sobrevive àquilo
ele se afasta.
e de longe observa o sofrimento dela
ele entende sua prisão
então ele desfaz o feitiço
segura seus braços
cospe na cara dela
diz umas palavras tortas
e ela acorda.
ele diz "agora você tá livre
pode ir"
mas tem um porém
sempre tem um porém...
você já não pode mais amar.

III.
então ela sai por aí sem rumo
e os homens já não existem pra ela
ela sente um vazio
e só.
ela trabalha, cria, produz
feliz de ser alguém
trabalha mais
cria amizades
a vida antiga
ela esqueceu
não fosse pelo rosto vincado
que ela não cansa de recriar
quando pinta, esculpe, desenha
quando canta, escreve, murmura
em tudo ele está

IV.
num dia cinzento de preguiça
sem razão alguma
ela olha no fundo do copo
a água turvou
e foi ele que ela viu
então ela pediu um uísque
que esquecer já não podia mais
e bebeu a saudade de anos
e naquele bar ela ficou
produzindo seu canto de amor
agora ela sabia que era um aquele
o amor
mas ela tinha que cantar
pra todos os outros que apareciam
e ninguém podia
levá-la para onde ela queria...

V.
o herói que nessa altura
era pai de santo, pajé, feiticeiro
seguia curando as pessoas
e em todas as lindas que ele via
procurava aquela uma primeira
que revelara a ele sua sina curandeira
mas dela não sentia nem o cheiro...
andou por toda a baía
prados, rochedos e selvas cinzentas

mas o dia que é o dia
um dia chega
e chegou.
e os dois se encontraram
a louca do bar
prisioneira do amor
e o herói curandeiro
o algoz de toda a dor
e os olhos que eles olharam
era mais forte que a prisão
e então foi que o encontro
finalmente
se deu



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